As origens
O cão e o gato têm antepassados comuns, integrados no grupo dos pequenos carnívoros que apareceram na Terra há 60 milhões de anos. Vinte milhões de anos depois dividiram-se no grupo dos aleuróides (antepassados do gato doméstico) e dos arctóides (antepassados dos cães).
Os primeiros cães fazem o seu aparecimento no continente norte-americano: trata-se do hesperocyon ou cão ocidental. A partir dele, depois de diversas fases evolutivas, surgiram o mesocyon, mamífero de focinho achatado, cauda longa, cinco dedos e plantígrado, como os ursos, e depois o cynodesmus e o tomarctus, todas formas intermédias do cão "moderno". O tomarctus, em particular, é considerado como o verdadeiro progenitor de todos os canídeos (cães, chacais, raposas, lobos...).
Temos de esperar algum tempo ainda para chegarmos aos canis etruscus (encontrados há 2 a 3 milhões de anos na Europa), os quais, há cerca de 750 000 anos, deram origem ao lobo.
- Segundo alguns estudiosos, o cão doméstico teve como predecessor o canis familiaris ou cão doméstico pré-histórico; segundo outros, foi o "cão pastor que, através de selecções intencionais ou de cruzamentos casuais, deu origem à espécie actual. Outras teorias dizem que o chacal é o verdadeiro progenitor do cão doméstico ou então que as suas origens remontam a formas de cães selvagens já extintas. A hipótese mais credível é que os antepassados do "nosso cão sejam os encontrados nas primeiras formas evolutivas de espécies diferentes (chacais asiáticos, chacais africanos e lobos abissínios); isto explicaria a difusão quase mundial e todas as afinidades comportamentais e físicas que há entre os cães domésticos e os canídeos selvagens.
A DOMESTICAÇÃO
Os restos mais antigos que demonstram, inequivocamente, a amizade entre seres humanos e cães remontam a cerca de 10 000 anos a.C., data que pode atribuir-se à sepultura encontrada em Israel de uma criança abraçada a um cachorro.
No início, provavelmente, a aproximação entre cães e seres humanos foi motivada, simplesmente, pelo desejo recíproco de companhia e de contacto físico. Talvez os cães pré-históricos seguissem as pegadas dos seres humanos para se apoderarem dos restos de comida e começassem a afeiçoar-se, associando, inevitavelmente, o positivo e o vantajoso. Os seres humanos, por seu lado, renderam-se muito rapidamente ao guarda eficiente e vigoroso, tendo em conta que o cão, pela sua natureza, avisa sempre da proximidade de inimigos e de predadores.
AS RAÇAS
Na Europa, os primeiros cães domésticos fazem o seu aparecimento entre as palafitas e parece que -como os seres humanos, com os quais convivem -têm origens orientais. Da análise dos restos encontrados, o tipo morfológico mais difundido era muito parecido com a actual raposa, o que explica que, ainda hoje, as n Iças mais antigas (lulu da Pomerãnia, japonesa, lhasa.. .), e sobretudo, muitos rafeiros tenham essa marca comum. A espécie canina tem, de facto, a particularidade de apresentar o polimorfismo mais acentuado sem se dividir em subespécies: nenhuma outra espécie animal apresenta uma tal variedade de tamanhos, pesos, formas, cores e texturas de pêlo, de estruturas e de formas ósseas e cranianas .. (contam-se cerca de 400 raças, que compreendem do são bernardo ao chihuahua). Estas características tão diversas são atribuídas tanto ao acaso como à selecção natural ou à acção do homem (que selecciona os animais com capacidades mais adaptadas ao seu estilo de vida).
AS ATITUDES E A SELECÇÃO HUMANA
Nas pinturas pré-históricas observam-se cenas de caça onde matilhas de cães perseguem as presas ao lado de homens armados de lanças. Com o avanço da civilização o cão tomou-se pastor incorruptível e companheiro de guerra. Assírios e Sumérios representaram cenas de caça e de guerra, onde cães ferozes combatem ao lado dos homens. Ilustres autores gregos narraram façanhas heróicas de cães que combateram em guerras e defenderam cidades de inimigos ferozes. E quem não conhece a história homérica da relação profunda de lealdade e de fidelidade entre o cão Argos e Ulisses? Virgílio ensina-nos que na sua época era costume cortar a cauda e as orelhas aos cães pastores para não proporcionarem zonas fáceis de agarrar aos animais ferozes com os quais tinham de lutar para defender os rebanhos. Já então se adestravam cães de guerra, e desde tempos imemoráveis no Oriente celebravam-se lutas de cães; na Roma Antiga, os cães de guerra gozavam da mesma consideração que os gladiadores e com eles combatiam no circo.
- Era lógico que o homem tentasse garantir os animais que melhor correspondessem às suas exigências e, assim, se um cão tinha dotes particularmente extraordinários, esperava-se encontrá-los nos filhos seleccionando a descendência. De alguma maneira estavam a nascer as raças que hoje conhecemos.
- No século VII, os cães mais considerados eram os de caça, protegidos por severas leis a seu favor. Os cães de matilha predilectos eram os lebreus ou galgos, mas também os sabujos começaram a ter êxito, os quais chegaram do Oriente depois das Cruzadas. Para a caça de grandes animais (javalis, cervos...) preferiam, no entanto, os molossos, que através de cruzamentos se foram tornando mais ágeis e velozes, dando origem ao actual alão. Com o florescimento da falcoaria nasce a necessidade de um cão adaptado particularmente à batida, e assim começou a selecção do spaniel. Para a caça com redes bastava, no entanto, um cão que se limitasse a assinalar a presa sem a assustar: inicia-se assim a selecção do cão de mostra.
- Através dos séculos, o homem procurou especializar o cão, adaptando-o a diferentes tarefas e criando os cãnones rígidos das raças actuais. Mas, muitas vezes, esta obra foi completada pela natureza, dando origem a que no mesmo exemplar coincidam diversas qualidades; é o caso do cão mestiço, fruto de diversos cruzamentos, mas devido, sobretudo, ao acaso. Nos cães sem raça, a selecção faz-se espontaneamente, assegurando ao máximo os dotes físicos e os intelectivos... Não é raro que um mestiço demonstre uma inteligência mais aguda e vigorosa do que um exemplar de raça. Costumam, também, ser mais longevos; é a criatura mais forte, saudável e adaptável a que se reproduz, transferindo estas qualidades para os seus descendentes.
NO ANTIGO EGIPTO
- Os Egípcios gostavam de representar os eus cães e imaginavam-nos altos e esbeltos como os lebreus ou os galgos e com as Ktremidades curtas como os basset. O cão egípcio mais célebre continua a ser Anúis, o deus da morte, com corpo de homem e cabeça de cão (ou chacal, segundo alguns). Naquela cultura, leis férreas protegiam a vida e o bem-estar dos cães, ao ponto de ser castigado com a morte quem matasse algum. Os cães eram submetidos mumificações e eram enterrados dignamente (como os gatos), com cerimónias lais ou menos pomposas segundo a condição social do dono.
INSTINTO DE ADOPÇÃO
Provavelmente foi um cachorro órfão o primeiro que entrou na comunidade humana. Mas não é claro quem adoptou quem. O instinto de adopção pode ser considerado um dom natural dos cães, pelo menos tanto quanto o é para os seres humanos.
As duas espécies, quer queiram quer não, actuam em res posta a exigências inatas das quais nem os seres humanos nem os cães têm plena consciência. Por vezes, não conta tanto a espécie adoptada: todos temos ouvido falar de coelhinhos, gatinhos, sarigueias... amamentados por uma cadela. E neste sentido também o homem o faz.
O instinto de adopção pode ser o impulso que determinou o início da relação com os amigos de quatro patas. O que nos ensina a lenda de Rómulo e Remo? Ou a história do Tarzan? Somos nós que adoptamos os cães ou são eles que nos adoptam? De qualquer modo, graças a este instinto primigénio, a convivência entre os seres humanos e os cães é possível e perdura pelos séculos, renovando-se sempre o terno e irresistível olhar de um cachorro que nos conquista.
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